Roseana é novamente citada em depoimento de ex-contadora de doleiro à CPI da Petrobras
A contadora Meire Bonfim da Silva Poza, que trabalhou para Alberto Youssef, afirmou à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, do Congresso, na quarta-feira (8), que o doleiro se reuniu com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para acertar investimentos do fundo Postalis, dos Correios, em uma empresa de Youssef. Segundo Meire, o encontro ocorreu em 12 de março deste ano, cinco dias antes da prisão do doleiro.O montante envolvido é de R$ 25 milhões, referente à metade de uma debênture lançada no mercado para arrecadar dinheiro ao empreendimento de Youssef. Esses R$ 25 milhões seriam aportados pelo Postalis. Os outros R$ 25 milhões, pelo Funcef, da Caixa Econômica Federal.
“Eu estive com Youssef no café da manhã no dia 14. Ele afirmou ter vindo a Brasília dois dias antes e ter resolvido com o PT a aprovação da operação. Ele também disse ter conversado com Renan para acertar a ponta que era do PMDB e que até o fim do mês a operação com o Postalis iria sair. Não saiu porque Youssef foi preso”, afirmou Meire.
O GLOBO revelou a história em 12 de setembro. Uma reportagem mostrou que a contadora, em depoimento à Polícia Federal (PF), afirmou ter havido uma reunião entre Youssef e Renan para tratar de investimentos de fundos de pensão. Segundo Meire, na reunião foi fechado um “acordo verbal” para que fundos de pensão investissem em ações de uma das empresas do doleiro.
No depoimento, Meire afirmou que parlamentares do PT e do PMDB fizeram as negociações pelos aportes dos fundos Postalis, dos Correios, e Funcef, da Caixa Econômica Federal (CEF), mediante uma suposta partilha de comissões com integrantes dos dois partidos. Pelo PT, as negociações teriam sido conduzidas pelo deputado federal André Vargas (sem partido-PR). A proximidade e negócios conjuntos do deputado com o doleiro já foram citados nas investigações da Operação Lava Jato.
A Funcef, em nota, esclarece que a acusação feita nesta quarta é “velha e surgiu pela primeira vez em abril deste ano”. A nota diz que o Fundo de Pensão não teve ou tem qualquer investimento nos negócios de Alberto Youssef.
Íntegra da nota:
“O Diretor Carlos Borges não conhecia o Sr. Alberto Youssef, mas o recebeu na qualidade de empresário, a pedido do Deputado André Vargas. No encontro, o empresário apresentou proposta de investimento à Funcef. Entretanto, identificamos que o investimento proposto não se adequava à política de investimentos da Fundação, momento em que foi prontamente descartado. Faz parte da rotina e atribuições dos Diretores, Gestores e Técnicos da Fundação atender gestores, empresários, consultores e técnicos de empresas e bancos para apresentarem seu portfólio de produtos e projetos para análises e possíveis parcerias com a Fundação. Este processo é disciplinado por normativos internos e legais que envolvem criteriosas avaliações econômico-financeiras, riscos, conformidade, jurídica, estratégia e governança, com emissão de pareceres técnicos das diversas áreas da Fundação e amplo processo negocial que suportam deliberação pelos órgãos estatutários da Funcef. A Funcef não tem parceria, negócios ou está analisando qualquer projeto com empresas vinculadas ao Sr. Alberto Youssef. O Diretor Carlos Borges conhece o Deputado André Vargas em razão das funções institucionais que ambos exercem.”
Em nota, a assessoria do Senador Renan Calheiros afirma que “não conhece a pessoa mencionada no noticiário como ‘doleiro’ Alberto Youssef e que só soube da existência do mesmo após as informações publicadas pelos jornais”.
Ainda segundo nota, Renan “nunca esteve, agendou conversas e nunca ouviu falar de Alberto Youssef e de sua contadora”.
O valor dos aportes dos fundos de pensão, ainda segundo o depoimento, seria de R$ 50 milhões. “Corretores” – intermediários que fariam o dinheiro chegar aos partidos – ficariam com 10%.
ROSEANA SARNEY E PROPINA – A contadora também citou no depoimento à CPI – como já havia feito em depoimento à Polícia Federal – uma suposta participação da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), no recebimento de propina por conta do pagamento de precatórios do governo do estado à Constran. Meire afirmou ter se reunido, juntamente com Youssef, com o então secretário da Casa Civil do Maranhão, João Guilherme Abreu. O interesse da Constran era receber R$ 123 milhões em precatórios.
Segundo a contadora, ficou acertado o pagamento de propina de R$ 6 milhões, por conta de um acerto para parcelamento dos precatórios em 24 vezes.
Uma das remessas teria sido levada por Adarico Negromonte, irmão do ex-ministro das Cidades Mário Negromonte. O valor foi de R$ 300 mil. A pessoa que recebeu o dinheiro teria reclamado da quantia e consultado a governadora Roseana se o montante deveria ser recebido.
“Adarico esteve no meu escritório depois da prisão do Alberto. Ele disse que foi ao Maranhão levar o dinheiro e que a pessoa afirmou que era pouco. Ela então teria entrado em contato com a governadora para saber se ela concordaria em receber os R$ 300 mil, e ela teria concordado”, disse a contadora.
Em nota, a governadora Roseana Sarney negou o episódio da propina, quando este veio à tona, em agosto passado: “A respeito da referência feita em depoimento à Polícia Federal da sra. Meire Poza, sobre a afirmação do senhor Adarico Negromonte, pessoa a quem não conheço, só pode receber de minha parte indignação e repúdio pela maneira desrespeitosa e infame de tal hipótese”.
VACAREZZA TAMBÉM É CITADO – Meire Poza afirmou ainda ter sido procurada por um assessor do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), João Lima, para operar investimentos do Igeprev, instituto de previdência do governo de Tocantins. Segundo o que o assessor teria relatado à contadora, “eles precisavam da comissão para pagar dívida de campanha’.
Naquela ocasião, segundo Meire, não havia qualquer relação com os negócios de Youssef. Posteriormente é que houve um aporte de R$ 13 milhões do Igeprev nas empresas do doleiro. Ela negou ter sido procurada diretamente pelo deputado.
“Não sei se João Lima pagou dívida de campanha. O que sei é que esses mesmos personagens fizeram a operação dos R$ 13 milhões do Igeprev. Como são os mesmos personagens, posso supor que o assessor de Vaccarezza tenha participado dessa intermediação entre o fundo de Youssef e o Igeprev”, afirmou.
O deputado Cândido Vaccarezza nega qualquer participação em operações de investimento do Igeprev ou uso de dinheiro para quitar dívidas de campanha:
“Eu nunca pronunciei esse nome, Igeprev. E essa contadora nunca teve contato comigo, ela própria disse isso. João Lima foi assessor da liderança do governo por um pequeno período de tempo. O que sobrou de dinheiro da campanha passada eu devolvi ao partido. E não tive dívida de campanha”.
CONTATOS COM EX-MINISTRO – A contadora contou também que o ex-ministro das Cidades, Mário Negromonte, mantinha contatos com o doleiro, e chegou a orientá-lo sobre a compra de uma empresa de controle de monitoramento de veículos em Goiânia. Negromonte, que renunciou ao cargo de deputado federal para assumir o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) da Bahia em junho deste ano, foi ministro da presidente Dilma Rousseff, entre fevereiro de 2011 e fevereiro de 2012.
O ex-ministro era visto com o doleiro num restaurante em São Paulo comprado por Youssef, segundo a contadora. De acordo com Meire, Negromonte indicou a doleiro a compra da empresa de monitoramento, pois haveria a aprovação do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). O Denatran é vinculado ao Ministério das Cidades. O irmão do ex-ministro, Adarico Negromonte, foi citado pela contadora como responsável por transportar o dinheiro das empresas do doleiro.
Em nota, Mário Negromonte diz que nunca teve relação de negócios com a empresa ou as pessoas citadas pela contadora. Negromonte declara ainda que Meire está a serviço “de pessoas que tiveram seus interesses contrariados”, e que o depoimento dado nesta quarta foi “irresponsável” e sem provas.
“Nunca tratei deste assunto do sistema de bloqueadores de veículos fora do Ministério das Cidades e quando foi tratado no Ministério, estavam presentes técnicos do Denatran, do Ministério e representantes da Anfavea”, afirma o ex-ministro da pasta. “Nunca tive relação de negócios de qualquer natureza com a empresa e as pessoas citadas pela contadora”, diz.
QUATRO EMPRESAS – No depoimento à CPI, a contadora Meire Poza elencou quatro empresas como clientes de uma das empresas de Youssef, a GFD Investimentos: Mendes Júnior, Sanko Sider, Engevix e Paranasa. Ela confirmou que a GFD não exercia qualquer atividade e que a principal fonte de receita do empreendimento eram repasses dessas empreiteiras, em troca de notas fiscais frias.
Meire Poza afirmou não ter “informações diretas” sobre os contratos das empreiteiras com a Petrobras. Ela disse ser possível, no entanto, que o doleiro tenha presenteado outros servidores da estatal, além do ex-diretor Paulo Roberto Costa.
PRESENTES – Costa ganhou uma Land Rover de presente do doleiro. Meire também confirmou que Youssef deu um helicóptero ao deputado federal Luiz Argôlo (SD-BA), no valor de R$ 800 mil. Ainda segundo a contadora, o doleiro presenteou a uma amante, de nome Taiana, apartamentos e restaurantes.
Quebras de sigilos telefônicos mostram diversas conversas entre Youssef e Taiana de Sousa Camargo, que trabalhou no gabinete da deputada federal Aline Corrêa (PP-SP).
“O Youssef recebia o dinheiro das empreiteiras e usava para comprar um terreno no Rio de Janeiro, por exemplo”, disse Meire no depoimento, em resposta aos primeiros questionamentos do relator da CPI, deputado Marco Maia (PT-RS).
Meire já prestou depoimento no Conselho de Ética da Câmara, que abriu processo para investigar a relação de Youssef com o deputado federal Luiz Argôlo (SD-BA). Na ocasião, ela confirmou que o parlamentar recebeu dinheiro do doleiro, disse que Youssef fez pagamentos a outras pessoas e o definiu como “banco”.
A contadora decidiu colaborar com a Justiça do Paraná, onde tramitam os processos relacionados à Operação Lava Jato, que desvendou um esquema de lavagem de dinheiro envolvendo um montante de R$ 10 bilhões. Ela confirmou a emissão de notas fiscais frias a empreiteiras, por meio das empresas de Youssef, com o objetivo de dissimular a prestação de serviços. Meire falou em “malas de dinheiro” movimentadas pelas empresas.