O Maranhão é do povo: as urnas consagraram o “xô, Sarney”
Por Fátima Oliveira
O Brasil que emergiu das urnas em 5 de
outubro fincou mais um marco de um novo tempo com a eleição de Flávio
Dino a governador do Maranhão. A República se vê livre de quase 50 anos
do nefasto Sarney agindo como dono do Maranhão, pois ele comandava a
oligarquia mais longeva da República e deixa como legado muita miséria e
pobreza, tanto que um pouco mais da metade do povo maranhense “escapa”
com o Bolsa Família.
Eis porque o governador eleito disse em
sua primeira entrevista: “Vamos fazer um pacote especial de providências
para as cidades com os menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH).
Quando eu terminar o governo, não vai haver nenhuma cidade do Maranhão
nesse ranking vexatório”.
E pensar que tudo começou porque o vivaldino Sarney obteve o
apadrinhamento de Rachel de Queiroz, prima do então ditador Castelo
Branco, para ser sagrado o indicado dos militares para concorrer ao
governo do Maranhão, o que obrigou os políticos maranhenses ao
degustamento de Sarney e ao povo uma opressão de 50 anos!
Ressalto que a querida escritora Rachel
de Queiroz apoiou o golpe militar, fato que hoje quase todo mundo
relativiza. Sarney foi visitá-la em sua fazenda Não Me Deixes, em
Quixadá, no Ceará! Correu o boato, por baixo de sete capas, de que
Sarney comprou baratinho sua candidatura a governador. Bastou chegar a
Não Me Deixes com cestos e cestos de camarão seco, carne de sol e
avoantes (Marcos Nogueira, em “A estratégia de Sarney para se eleger
governador do Maranhão em 1965”).
O fato inconteste de que mais da metade da população maranhense
sobrevive do Bolsa Família nos leva à indignação. A fome é um tema muito
estudado e sobre o qual há inúmeras opiniões. É quase unânime que o
espectro da fome é de uma crueldade vil e que os governos que permitem
que seu povo passe fome são desumanos. Estamos em 2014, e tantos anos
depois da publicação de “Geografia da Fome” (1946), do médico brasileiro
Josué de Castro (1908-1973), a sua constatação de que “metade da
humanidade não come; e a outra metade não dorme, com medo da que não
come”, só começou a ser superada, no Maranhão, após a instituição do
Bolsa Família pelo governo federal! Há muito por fazer para minorar o
sofrimento das pessoas menos favorecidas.
Sobre a fome, apresentei no 6º Congresso
Mundial de Bioética (Brasília, 30.10 a 3.11.2002) o ensaio “Feminismo,
raça/etnia, pobreza e bioética: a busca da justiça de gênero,
antirracista e de classe…”, no qual digo que “A pobreza deve ser
contextualizada e reatualizada a cada momento que nos referimos a ela.
As pessoas pobres são catalogadas como populações supérfluas – alijadas
do mercado de consumo e de trabalho, logo descartáveis. A Organização
das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) afirmou, em 2001,
que há no mundo 1,2 bilhão de pessoas vivendo, cada uma, com menos de
US$ 1 por dia e que 75% delas habitam áreas rurais, onde a economia é
baseada na agricultura. Logo, é um mito a crença de que a pobreza está
concentrada nas regiões urbanas.
Por que a notícia de o Brasil ter sido
excluído do Mapa da Fome, pela FAO, recentemente, foi quase escondida
pela grande mídia? Elementar: a fome e a miséria evidenciam que a
opulência e a riqueza de poucos, historicamente, integram a perversidade
dos sistemas de concentração de renda e de exploração; logo a fome e a
pobreza são problemas políticos. E, inegavelmente, o Bolsa Família as
enfrenta como problemas políticos, o que não é pouco.