O partido enfrenta o pleito mais difícil desde que chegou ao poder, em 2002. O objetivo é ampliar a vantagem no Nordeste, para compensar o desempenho fraco em São Paulo
LEANDRO LOYOLA COM LEOPOLDO MATEUS
22/10/2014 07h00
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Durante dois dias logo após o primeiro turno, a presidente Dilma Rousseff
passou em campanha eleitoral por cinco Estados do Nordeste – Piauí,
Paraíba, Bahia, Alagoas e Sergipe. Com apoio de governadores aliados
recém-eleitos ou favoritos, Dilma expôs novamente seu discurso que louva
o baixo índice de desemprego, exalta programas sociais, fala
discretamente em ameaças de interrupção desses benefícios se for
derrotada e acusa os adversários tucanos de praticar juros altos e de
não gostar de pobres. O discurso é muito parecido em qualquer região,
desde o início da campanha. Dilma foi ao Nordeste em busca de uma zona
de conforto, para recomeçar após uma vitória apertada no primeiro turno.
Não existe vitória ruim. Mas a de Dilma expôs uma fraqueza. Sua
vantagem foi pequena, seu adversário teve mais votos que o esperado e,
mais preocupante, ela perdeu por uma diferença significativa em São
Paulo, o maior reduto de eleitores do país.
Há quatro semanas, a campanha de Dilma sabia que ela perderia no Estado
de São Paulo. Não sabiam o tamanho da diferença. Nas urnas, foram cerca
de 5 milhões de votos a menos que Aécio Neves, do PSDB. As pesquisas qualitativas feitas pela equipe do marqueteiro João Santana
revelavam um terreno pedregoso para Dilma em São Paulo. Nesses
levantamentos, em que os eleitores falam sobre diversos temas, ficou
claro que o problema em São Paulo não é tanto Dilma em pessoa, mas uma
certa aversão ao PT. Os eleitores rechaçam o comportamento do PT após o
julgamento do mensalão, e o modo como o partido reagiu à prisão de José Dirceu, José Genoíno e Delúbio Soares.
Em vez de admitir seus erros, o PT defendeu os condenados com
estridência, com ataques virulentos à Justiça e ao então presidente do
Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. Nas entrevistas feitas pelos marqueteiros petistas, os eleitores demonstravam desaprovação a isso.Um fato inusitado – desses que acontecem na política brasileira e, talvez, em mais dois ou três países – prejudicou ainda mais a campanha. Em maio, a maioria dos paulistas ficou sabendo que o deputado estadual petista Luiz Moura era suspeito de participar do esquema de lavagem de dinheiro de uma facção criminosa por meio de cooperativas de transporte público. A história de Moura é de arrepiar: ele é um ex-assaltante, preso por dois roubos à mão armada. Fugiu da cadeia e, anos depois, entrou na política. Moura foi rapidamente expulso pelo PT. Mas sua história ficou na memória dos eleitores, que uniram esse fato à solidariedade histérica aos mensaleiros e passaram a ter uma imagem negativa do PT em relação à corrupção. A equipe de Dilma percebeu nas entrevistas que, na mente de muitos eleitores paulistas, os petistas passaram a habitar o lugar que já foi dos malufistas.
Dilma poderia superar isso, não fosse um problema maior na economia. As previsões de crescimento do PIB do Brasil neste ano estão em apenas 0,3%. A campanha de Dilma desenvolveu um discurso em que culpa a crise internacional por isso. Afirma que, diante de tal adversidade, o governo ainda conseguiu a façanha de preservar o nível de emprego. Esse discurso tem menos efeito em São Paulo, porque os paulistas são os primeiros a sentir os efeitos da desaceleração econômica, ainda menos percebida em regiões como o Nordeste. O emprego na indústria brasileira registrou queda de 3,6% em julho, em relação a julho de 2013, de acordo com o IBGE; em São Paulo, essa queda foi de 5,1%. Depois de anos de prosperidade com Lula, metalúrgicos na capital e na região do ABC já sofrem com demissões – ou, pelo menos, com férias coletivas e jornadas mais curtas, os recursos que antecedem a dispensa. “A crise chegou primeiro a São Paulo”, afirma um assessor de Dilma.
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Uma das esperanças do PT era a atuação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele permaneceu em São Paulo durante boa parte da campanha, para ajudar seu candidato ao governo, o ex-ministro Alexandre Padilha. As criações de Lula mais atrapalharam que ajudaram Dilma. O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, uma invenção de Lula, eleito de forma espetacular, vive um momento de baixa popularidade – como a maioria dos prefeitos, devido à crise financeira. Em parte por culpa dele, Padilha teve o pior desempenho de um candidato petista no Estado desde 1998. A frustração foi tamanha que Lula chegou a dizer que não entendia como alguém votava no tucano Geraldo Alckmin, eleito em meio a uma grave crise de falta d’água no Estado.
Os coordenadores da campanha de Dilma ainda não têm uma solução para um problema eleitoral de tal dimensão. A saída no primeiro momento foi buscar apoio no Nordeste para obter mais votos e, com isso, tentar compensar o mau desempenho paulista. O Nordeste reúne o maior contingente de beneficiados pelo Bolsa Família, os mais sensíveis à ameaça da perda do benefício em caso de derrota de Dilma. O Nordeste também cresceu mais que o resto do país nos últimos anos. Isso facilita a aceitação do discurso econômico de Dilma. A tática para a região inclui atuar no Ceará para neutralizar a aproximação do senador Eunício Oliveira, candidato do PMDB que disputa o governo do Estado, com Aécio. Pernambuco é um Estado considerado perdido pelo PT. Apesar de Lula ser pernambucano, o momento ainda é de nostalgia por Eduardo Campos. Um dos recursos usados pelos petistas em propagandas em Pernambuco é um discurso de Aécio no Senado, quando tentava maneiras de fazer com que uma nova fábrica da montadora Fiat não fosse para lá, mas permanecesse em Minas. Alguns dos Estados visitados por Dilma terão papel fundamental no enfrentamento com o PSDB (leia o quadro abaixo).
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Aécio terá dificuldades no Nordeste para superar as vantagens de Dilma. Seu plano inclui o combate ao medo, espalhado na população local, de algum abalo às políticas sociais num governo tucano. Diante da dificuldade de atuar num terreno onde o PT está tão arraigado, a campanha de Aécio fará, no início, o caminho inverso de Dilma. Os tucanos acreditam que podem reforçar a campanha em São Paulo para atingir mais de 60% dos votos. Há uma ofensiva em curso no Rio. No primeiro turno, o candidato do PMDB ao governo, Luiz Fernando Pezão, se dividiu entre Dilma e Aécio. Na semana passada, líderes do PMDB do Rio avisaram a direção nacional que querem ir com Aécio. O principal deles, o deputado Eduardo Cunha, fez um acordo recente com Aécio. No início da campanha, ele combinou com Aécio que, se o PSDB desistisse de ter candidato ao Senado no Espírito Santo, Aécio teria o apoio do candidato do PMDB ao governo, Paulo Hartung. Assim foi feito.
Desde o início, a campanha de Dilma procurou identificar os adversários – num momento Marina Silva, noutro, Aécio – como candidatos dos ricos contra os pobres, defendidos apenas pelo PT. Não é bem assim. Um levantamento feito para ÉPOCA pelo Instituto Paraná Pesquisas mostra que a nova classe média e a população mais pobre estão divididas entre PT e PSDB – em parte, porque as classes D e E sentem o efeito da crise econômica e apostam numa mudança. A divisão agora parece ser regional, não social. Para vencer, o PT terá de vencer de goleada em seu território, e perder de pouco fora dele.